Fazer exercícios, beber água, comer comidas saudáveis, não fumar… Cuidar da nossa saúde física é uma parte muito importante para o bem-estar de um modo geral, e é muito valorizada na sociedade atual – tanto para aumentar a longevidade quanto para atingir um objetivo estético. Mas existe outra parte da saúde individual que muitas vezes é ignorada, mas que é tão importante quanto a saúde física (ou talvez até mais): a saúde mental.
Mas afinal, o que é saúde mental? Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a saúde mental é definida como um estado de bem-estar no qual o indivíduo é capaz de lidar com as suas emoções de maneira equilibrada, além da ausência ou do controle de transtornos mentais. Ela tem influência direta na saúde física e é determinada por diversos fatores sociais, biológicos e psicológicos.
Uma saúde mental fora de equilíbrio pode levar a diversas dificuldades, tanto no dia a dia quanto a longo prazo, e até mesmo a tentativas de suicídio. Por isso, a saúde mental vem ganhando muita importância nos últimos anos, e desde 2014 o mês de setembro é chamado de Setembro Amarelo, em uma campanha mundial pela prevenção do suicídio, que ressalta a importância de cuidar da saúde mental – tanto a sua quanto a das pessoas próximas de você.
Para entender melhor como detectar se alguém próximo precisa de ajuda e como melhor proceder nessa situação, separamos algumas das perguntas mais comuns a serem feitas nesse momento, e contamos com a orientação de Lais Boralli Razza, com formação em psicologia, especialização em neuropsicologia e cursando doutorado em Psiquiatria pelo Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP.
Quais são as doenças emocionais mais comuns?
“Quando falamos de doenças emocionais, ou de transtornos de humor, usamos as classificações DSM ou CID-10, que são duas ferramentas que profissionais de saúde num geral usam para padronizar e normalizar alguns sintomas que os pacientes costumam sentir,” explica Lais. “Segundo essas classificações, os transtornos de humor mais comuns hoje em dia, que estão mais no centro das discussões, são os transtornos depressivos, o transtorno bipolar e os transtornos de ansiedade.”
“Recentemente o transtorno burnout também ganhou muita visibilidade, por conta do grande número de pessoas que apresentam sintomas desse transtorno. Apesar de ainda não ter sido oficializado no DSM, ele pode ser classificado como um transtorno de humor, caracterizado pelo esgotamento físico e mental por motivos profissionais. Seus sintomas são muito parecidos com o da depressão e da ansiedade, então ele é muito associado com esses dois outros transtornos.”
Quais sintomas devo prestar atenção em pessoas próximas?
Segundo Lais, existe uma variação muito grande de sintomas entre os diferentes transtornos, mas os sintomas da depressão estão entre os mais comuns e perceptíveis entre eles. Uma mudança de humor brusca, mas que se estende por dias é um desses sintomas: quando ela passa de duas semanas, já é hora de prestar atenção. “O que eu levo mais em consideração é a mudança de humor que se estende por dias, e que está tendo impactos negativos e interferindo na vida do indivíduo, nos afazeres e atividades”, explica.
Como diferenciar mudanças de humor comum de um transtorno mental?
A duração e a intensidade dessa mudança de humor são os dois principais fatores que diferenciam uma tristeza “comum” de um quadro depressivo. Além da duração de mais de duas semanas, a depressão traz consigo uma sensação chamada de “anedonia”, que é a perda de interesses e prazer em passatempos que a pessoa considerava prazerosos e importantes. A perda ou ganho perceptível de peso também pode ser observada, assim como episódios de insônia ou irritabilidade.
Crises de ansiedade também são comuns na depressão, e podem ser caracterizadas por taquicardia, sensação de que vai perder o controle de tudo, falta de ar abrupta, sudorese e inquietação absurda. Dificuldades cognitivas também estão entre os sintomas mais comuns, como a dificuldade de concentração, de memorização e a sensação de perda de palavras durante conversas, entre outros. “É um emaranhado de sintomas juntos, não necessariamente todos ao mesmo tempo, mas alguns deles,” esclarece Lais.
Como abordar o assunto com alguém que precisa de ajuda?
A presença de um transtorno de humor ou de qualquer outro diagnóstico psiquiátrico ainda é um assunto que vem carregado de muito preconceito na nossa sociedade atual, e é encarado como um sinônimo de fraqueza individual. Ainda existe uma certa dificuldade de aceitação por parte de muitas pessoas, tanto de quem está passando por um momento difícil tanto para quem convive com essa pessoa. Por isso, ao abordar o assunto com alguém que você sente que está precisando de ajuda, é necessária uma boa dose de tato, delicadeza e compreensão.
Outro ponto importante é a insistência. Por causa do estigma que os diagnósticos psiquiátricos carregam, é muito comum que a pessoa negue que está se sentindo deprimida, mas se realmente existe uma preocupação, é essencial que você continue a mostrar para ela as mudanças que você tem observado, na rotina e no comportamento, tentar sempre falar sobre o assunto e saber ouvir, discutir e dar espaço para que essa pessoa se sinta confortável para se expressar e falar sobre o momento que ela está passando, e depois ser direcionada para ajuda profissional.
O que evitar dizer para alguém que está passando por um momento difícil?
Ao tentar ajudar alguém que pode estar passando por um episódio depressivo, é comum que sejam utilizadas frases de motivação e que inspiram ação, mas também é muito importante evitar falas que diminuem a importância e a gravidade da situação. Frases como “vai passar”, “é só um momento”, “vamos sair dessa cama e tomar um banho” são alguns dos exemplos mais comuns e que devem ser evitados, por terem um efeito negativo no processo de aceitação e superação da depressão.
Nesse momento, a orientação profissional de Lais é simples: “É preciso evitar achar que aquele momento específico da pessoa que está passando por essa situação delicada e sensível é só frescura”.
Como manter a saúde mental em boas condições
Para manter a saúde mental em dia, as recomendações são comuns: manter uma boa alimentação; uma rotina regular de sono, de preferência com 8 horas dormidas por noite; praticar exercícios físicos, que liberam endorfina e são uma ótima maneira de diminuir o estresse e a tensão.
Além disso, relações sociais de qualidade são essenciais para a manutenção da saúde mental. Humanos são seres sociais, e se rodear de pessoas que nos fazem bem é uma parte importante do nosso bem estar. Atividades de lazer também tem uma grande influência na saúde mental: é importante passar uma parte do tempo depositando energia em coisas que trazem a sensação de prazer, e descansam a mente de situações de stress, como o trabalho ou problemas familiares.
Porém, é importante ressaltar que doenças mentais são o resultado de diversas variáveis combinadas, e por isso, mesmo todas essas medidas podem não ser o suficiente para manter a saúde mental em um lugar positivo, como explica Lais: “Quando se fala de doença mental, falamos de várias variáveis juntas, tanto de ambiente atual, quanto das experiências de vida, o ambiente no qual a gente se desenvolveu, a genética… Então é difícil determinar apenas um fator, é sempre um conjunto de coisas”.
O acompanhamento psicológico também é considerado de alta importância, tanto para quem apresenta sintomas de transtornos mentais quanto para quem está em uma fase saudável e deseja se manter nela. Procurar um psicólogo e ter um acompanhamento regular da saúde mental evita que os transtornos de humor tenham uma oportunidade de se desenvolver e atingir níveis mais graves, e é uma parte importante para quem deseja levar uma vida saudável, feliz e produtiva.